Wednesday, 28 March 2012


Borromini e Romário – meter o Rossio na Rua da Betesga


Romário foi treinado por Cruyff na equipa do Barcelona do princípio dos anos 90. O brasileiro era considerado pelo seu treinador um jogador de trato complicado, mas um verdadeiro génio da grande área.
Romário

Romário, dizia Cruyff, de um lenço de assoar faz um latifúndio.

Romário era então capaz de um espaço muito curto fazer maravilhas. Uma nesga, uma viela, um beco para muitos seria o suficiente para que o avançado demonstrasse o seu talento. Fazia-o com elegância, altivez e facilidade. Uma finta de corpo, uma esquiva e a bola estava na baliza adversária.

O espaço disponível era exíguo, mas o talento de Romário eliminava essa limitação. Eram actos de ilusionismo e de escapismo.

Francesco Borromini foi um arquitecto que viveu entre 1599 e 1667 e que partilhou com Bernini e com Pietro da Cortona algum do protagonismo da arquirtectura barroca em Roma.


Francesco Borromini
Diz-se que tinha temperamento difícil e que terá desenvolvido uma rivalidade acesa com Bernini.

O nome de Borromini é essencialmente associado às igrejas de Sant’Agnese in Agone (obviamente situada na Piazza Navona), com Sant’Ivo alla Sapienza e com San Carlo alle Quattro Fontane (San Carlino).

A minha favorita é a de San Carlino justamente numa das esquinas da Quattro Fontane, no Quirinal.
 O nome de San Carlino é adequado. Como português entendo perfeitamente que os diminuitivos vão muito para além de qualificar tamanho, mas que também têm um sentido carinhoso, de preciosidade, de uma complexidade recatada e circunspecta. Beber umas cervejinhas ou comer uns bifinhos não significa que fiquemos com sede ou com fome, mas sim que a tarefa e os objectos nos são queridos e que são muito mais do que parecem ou soam (lá está a nossa mania com os carros quitados e com as marquises convertidas em extensão de quarto).
San Carlo alle Quattro Fontane - Fachada
A via delle Quattro Fontane é muito movimentada e a igreja pode passar despercebida, mas alguém avisado ou um olhar atento descobrirá a fachada côncava e dinâmica da igreja.
 A entrada é apertada e discreta e dá a impressão de que me dirijo a um espaço pouco maior de que uma sala de jantar de dimensão média. A surpresa está no interior.

 A igreja – que afinal pertence a um pequeno complexo monástico com claustro e quejandos – parece esticar-se para os lados e para cima em direcção a uma cúpula com padrões intrincados.

Apesar da exiguidade do espaço o olhar necessita de tempo para descobrir  todos os recantos, altares e formas que dão a ilusão de movimento, de vários cenários a explorar e de um espaço enorme e rico.


San Carlo alle Quattro Fontane - Cúpula
 A exuberância e jocosidade do barroco estão presentes ainda que, nas formas e nas cores, de uma forma menos ostensiva do que outros exemplos do barroco (como por exemplo Santa Maria della Vittoria, de Bernini, não muito distante de San Carlino).



Tudo parece detalhado e desenhado para usar todo o espaço disponível de forma elegante e bela e sou levado a crer que estou num espaço enorme. O logro resulta.

Borromini, tal como Romário, da escassez criava abundância e, para meu deleite, fabricava a ilusão de que tudo é possível.



No comments:

Post a Comment